sexta-feira, 17 de maio de 2013

O "bolsa bandido"

Os que leram as últimas edições dos periódicos brasileiros se assustaram com a divulgação do pagamento de um benefício às famílias dos que estão presos. Alguns noticiários foram fiéis aos que está acontecendo, outros nem tanto. Na verdade, trata-se do auxílio reclusão. Mas, o que é mesmo esse auxílio? Ele é um “bolsa bandido”?

Da forma como está sendo propagado à opinião pública, dá a impressão de que o governo está pagando a todas as famílias dos presos esse benefício, como se estivesse incentivando a criminalidade. Ora, em um país de desempregados, o sujeito cometer um crime e ainda receber da União por isso seria o cúmulo dos absurdos.

Felizmente não acontece dessa maneira ou, no máximo, não é assim que ocorre. Isso porque somente tem direito ao auxílio reclusão as famílias de trabalhadores contribuintes para a previdência social. A maioria absoluta dos que cometem crimes, cerca de 90% (noventa por cento), não recebe o benefício. De 500.000 presidiários, apenas as famílias de 40.000 recebem o auxílio.

Tal situação reflete a realidade brasileira de que os crimes são cometidos por pessoas sem ocupação. Os chamados “vagabundos” não recebem o auxílio reclusão porque não possuem a qualidade de segurado. As famílias da quase totalidade dos homicidas, traficantes e latrocidas não recebem o auxílio reclusão, porque os autores dos delitos não possuíam emprego lícito.

São considerados segurados o empregado, o trabalhador avulso, o empregado doméstico, o contribuinte individual, o segurado especial e o segurado facultativo. O empregado é o possuidor de carteira assinada e os que a empresa ou órgão público recolhem mensalmente a contribuição previdenciária.

Essa qualidade de segurado pode ser perdida caso cesse o pagamento das contribuições mensais por mais de 12 meses. Portanto, para que as famílias dos presidiários possam receber o auxílio reclusão, o preso deve ser contribuinte da previdência social e ainda não ter perdido a qualidade de segurado pela ausência do pagamento das contribuições.

Por outro lado, somente as famílias de segurados de baixa renda têm direito ao benefício. Para os dependentes se habilitarem ao recebimento do auxílio, o segurado não pode ter recebido mais de R$ 915,05 mensais. Caso perceba mais do que esse valor, o auxílio reclusão não é devido.

Se o auxílio reclusão é um amparo às famílias dos presidiários contribuintes da previdência social, é certo que não há, no Brasil, um programa de amparo às famílias das vítimas da violência não segurados da previdência. Como, em nosso país, a incidência do emprego informal é muito grande, as famílias vitimadas terminam sofrendo a perda duas vezes, uma pela morte ou incapacidade em si e a outra pela ausência do provedor.

Tal situação decorre de uma violência desmedida vivida pelo povo brasileiro. Sou professor de Direito penal e fiz recentemente uma pesquisa com os meus alunos a respeito de assaltos. Praticamente todos já foram ou tiveram familiares assaltados. Ouço relatos freqüentes de alunos que foram abordados por ladrões no início ou no fim das aulas. 

No primeiro semestre deste ano, 305 pessoas foram vítimas de homicídio na Capital do Estado de São Paulo. São números alarmantes que indicam falhas gritantes do sistema penal brasileiro. Diante de um quadro tão grave é preciso que se adotem medidas urgentes de combate ao crime, tanto na prevenção quanto na repressão.

O combate ao tráfico de drogas talvez seja o primeiro passo. Essa chaga que assola o Brasil precisa de controle. Em recente estudo, constatou-se que a principal causa dos roubos e latrocínios é a droga. Afastá-la das escolas e da juventude é tarefa que se impõe. Aliada a tal medida deve-se dar cidadania às pessoas, com emprego, saúde e educação.


Roberto Veloso é juiz federal e professor doutor da UFMA

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